A semiótica na propaganda política brasileira

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Apresentamos, sem detalharmos muito, as noções teóricas da manipulação na semiótica objetal e a análise de dois textos da revista Veja, assim distribuídos: um sobre a declaração de FHC sobre Roseana SARNEY e outro, a reportagem sobre Roseana.

Perspectiva Teórica

Observamos, inicialmente, que a manipulação, no âmbito da semiótica objetal, está inserida na sintaxe narrativa de superfície quando determina as funções sintáxicas dos actantes em dois grupos subdivididos. Assim, temos:

O sujeito do fazer-querer

A modalidade /fazer-querer/ compreende a vontade do sujeito destinador tornar alguém competente. Enquadram-se neste conjunto a sedução e a tentação.

1.1 - A sedução é expressa pelo elogio do sujeito destinador para o sujeito destinatário. Por exemplo:

– Você é uma pessoa prestimosa!

– És muito disposta e trabalhadeira!

1.2 – A tentação envolve valores materiais entre a comunicação do sujeito destinador para com o sujeito destinatário. A mesma ocorre quando o sujeito destinador oferece suborno ao sujeito destinatário, como por exemplo:

– Quando o governo norte-americano oferece cinco milhões de dólares para aquele que souber do paradeiro de Osama bil Laden.

O sujeito do fazer-dever

A referida modalidade do /fazer-dever/ implica numa obrigação entre o sujeito destinador para com o sujeito destinatário. Faz parte deste contexto à provocação e a intimidação.

2.1 – A provocação é desafiadora. A mesma leva o sujeito destinatário a ser desafiado pelo sujeito destinador. Vejamos, desta maneira, com THALIA, atriz mexicana (Apud ISTO É, 28/06/2000):

Cuidado, senão eu os devoro! Especialmente, os homens (2000: 26)

2.2 – A intimidação acontece através da ameaça do sujeito destinador para com o sujeito destinatário onde está presente a dimensão cognitiva e a dimensão pragmática. Isto acontece, quando o pai ameaça o filho em relação aos estudos:

– Se você vir com nota vermelha, tirarei a mesada.

GREIMAS & COURTES (1989), dentro do exposto, esclarecem:

a) O manipulador (...) proporá então ao manipulado objetos positivos (valores culturais) ou negativos (ameaças); em outros casos ele persuadirá o destinatário graças ao saber*: na dimensão cognitiva*, fará então com que ele saiba o que pensa de sua competência modal sob forma de juízos positivos ou negativos.Vê-se, assim, que a persuasão segundo o poder caracteriza a tentação (em que é proposto um objeto-valor positivo) e a intimidação (em que é proposta uma doação negativa), enquanto a persuasão, segundo o saber, é própria da provocação (com um juízo negativo: “Tu és incapaz de...”) e da sedução (que manipula um juízo positivo) (1989:270).

O texto de FHC sobre Roseana Sarney (VEJA, 28/11/2001: 22) ilustra a forma de manipulação semiótica quando diz: “O Brasil quer uma coisa de mulher, uma coisa positiva”.O “Brasil” como sujeito-do-querer é seduzido pela “coisa positiva de mulher”. Podemos nos perguntar: mas que “coisa positiva” é esta? Podemos relacionar “coisa positiva”, seguindo o parâmetro greimasiano, com os objetos positivos (valores culturais). Fazendo uma ponte com a antropologia, os mesmos (valores culturais) abarcam tudo o que é fabricado pela mão do homem que transforma tudo o que está ao seu alcance, ou seja, são as expressões de sua interferência na natureza. Assim, o que podemos imaginar sobre a ação do homem na modificação da natureza constitui os referido valores culturais, tais como: atividades econômicas (agricultura, comércio e indústria), atividades artísticas (música, artes plásticas, literatura, cinema, televisão, teatro, escultura, arquitetura etc.), atividades científicas e tecnológicas, atividades políticas, atividades religiosas etc. Desses valores culturais, quais que o sujeito destinador “Brasil” quer do sujeito destinatário “mulher”? O sujeito destinador é seduzido ou tentado, ou ambas manipulações, pelo sujeito destinatário? O sujeito destinatário “mulher” seduz o Brasil com a beleza, a simpatia e o sorriso feminino. É o que a revista Veja (14/11/2001: 36) declara sobre Roseana Sarney: “O que aparece na televisão é uma mulher dinâmica, bonita, simpática, sorridente”.

Podemos retirar, a partir da referida declaração, que o dinamismo, a beleza, a simpatia e o sorriso constituem a isotopia textual das propagandas políticas sobre Roseana, ou seja, os lexemas eufóricos ocorrem devido ao seguinte fato, como coloca a revista Veja (14/11/2001):

Sua ascensão é resultado direto de um trabalho de laboratório. Nos últimos três meses, Roseana tem sido a única estrela na propaganda do PFL. Foram setenta inserções em cadeia nacional e duzentos e cinqüenta em redes regionais, de trinta segundos cada uma. Nos comerciais, ela não faz discurso, não critica ninguém, não apresenta propostas nem faz promessas (2001: 14)

Pela lógica, o disfórico, ou seja, o que é negado e não aparece no texto são os lexemas de oposição no aspecto paradigmático, relacionados a seguir: apatia, feiura, antipatia e carranca. Lembremos que dentro da linguagem visual a prossêmica é de suma importância na comunicação não-verbal, onde o visual responde aproximadamente por 55% da apreensão comunicativa.

Quando relacionamos a declaração de FHC com a da Revista, estamos trabalhando com a questão valorativa. Naturalmente que é do ser humana a capacidade de atribuir valores ao que ele faz, (...) avalia (...) a realidade como bela ou feia, boa ou má, agradável ou dolorosa, nobre ou comum, santa ou impura (...) a vida humana é um tecido de apreciações e avaliações (cf. BOCHENSKI 1977: 67). Assim, somos atraídos, ou semioticamente falando, manipulados pela sedução quando algo nos aparece como belo, agradável e santo. O sujeito destinador “Brasil” tem como objeto modal, objeto de valor, o /querer/ a coisa positiva da mulher que na leitura antropológica e filosófica de BOCHENSKI (1977) pode englobar os valores morais, estéticos e religiosos. Os valores morais centram-se na ação /dever-fazer/ e /dever-ser/. Os valores estéticos referem-se ao belo, ao feio, ao elegante, ao rude, ao nobre, ao suave etc. São de outra ordem os valores religiosos. Qual desses valores que o Brasil quer?

Para averiguar a veracidade da “coisa positiva” relacionada com lexemas eufóricos, recorremos às modalidades veridictórias em GREIMAS & COURTES (1989: 487-88) desta forma diagramada:



Podemos verificar as mesmas, modalidades veridictórias, no contexto de onde imanam as imagens propagandísticas – televisão - sobre Roseana Sarney. Portanto, é a partir da isotopia onde podemos retirar os semas profundos do texto em questão. Para encontrar os mesmos, é que fazemos a indagação: o que afirma (euforia) e o que nega (disforia) o texto? Isto constitui o ponto de partida para a análise semiótica do texto. Fora do mesmo (texto), ou seja, o extratextual foge completamente da proposta semiótica objetal, quando, por exemplo, fazemos outras abordagens: sociolingüística e psicolingüística. Assim, toda a significação é retirada no texto.

Por Miguél Eugênio Almeida (UEMS)

Fonte: Filologia

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